Interpelação Pag. Principal >> Interpelação

INTERVENÇÃO ANTES DA ORDEM DO DIA

 

No final da semana passada, a maioria da comunicação social escolheu como notícia principal à evacuação de 200 famílias residentes no Edifício “Sin Fong Garden”. Trata-se de um facto inédito na história da RAEM. Muitos cidadãos perguntaram, como foi possível, deixar chegar, até este ponto. Acham que, se as autoridades tivessem levado a sério, meses antes, as queixas apresentadas pelos evacuados contra as demolições dos prédios adjacentes, estas tragédias, talvez teriam sido evitadas.

Pude assistir, no local da tragédia, desde a manhã do 11 do corrente até ao final da tarde, uma tristeza profunda estampada na maioria dos rostos dos evacuados. Os evacuados mantiveram-se de uma forma ordenada nos passeios na esperança de regressar rapidamente às suas casas, uns para trocar as roupas usadas desde o dia anterior, outros para reaver bens essenciais e de primeira necessidade.

Alguns idosos pretendiam reaver medicamentos. No local, para além dos agentes da PSP só estavam alguns responsáveis dos Serviços de Obras Públicas. Os evacuados, mesmo debaixo do sol, permaneceram no local, sem almoço, para não perderem a oportunidade de entrar nas suas residências.

Os evacuados queriam informações, mas estas, não existiam. Os evacuados pretendiam respostas para as suas múltiplas preocupações, mas ninguém a nível oficial se dignou alguma vez a dialogar com evacuados.

Pelas 15H00, chegou o Chefe do Executivo (CE) à frente de uma grande comitiva de directores de serviços públicos e do Secretário Lao Si Io. O Gabinete de Comunicação Social (GCS) de uma forma “inteligente” colocou os jornalistas em frente dos evacuados, separados por barreiras e em local estratégico, fazendo parecer que o CE estava a dirigir-se aos evacuados.

Aliás, os evacuados estavam muito esperançados em ouvir as palavras de conforto do CE. Mas não conseguiram ouvir nada, face à distância e à barreira de jornalistas. E o mais grave, esqueceram de providenciar um altifalante ao CE de modo a permitir que os evacuados pudessem também ouvir as palavras do CE.

Evitando dialogar com os evacuados que se encontravam presentes, o CE optou por dirigir-se aos meios de comunicação social. O CE referiu várias vezes a questão de segurança e a intenção do Governo de ajudar os evacuados. Como referi, a maioria dos evacuados não conseguiram ouvir nada e pediram-me para saber o que o CE havia proferido aos meios de comunicação social.

Após a curta intervenção do CE e sem responder às numerosas perguntas que os jornalistas pretendiam fazer, o CE virou as costas, foi-se embora. E da mesma forma, viraram-se as costas e foram embora todos os elementos da sua comitiva. O “show” tinha terminado. Missão e objectivos cumpridos perante as câmaras de televisão.

Desde o início até ao final do dia, os evacuados, nunca tiveram a oportunidade de falar directamente com as entidades oficiais. Porque as entidades oficiais estiveram sempre mais preocupadas com os meios de comunicação social, em vez de proferir palavras de conforto, esperança aos evacuados.

Através de terceiros, os evacuados foram informados de que o Governo iria dar no final da tarde, uma conferência de imprensa. Os evacuados, por via de telemóveis, tiveram alertar de imediato os seus familiares e amigos para prestarem atenção aos canais televisivos.

No local, restaram somente os agentes fardados da PSP. Um idoso e doente, mal arrastava-se no local e necessitava de um assistente social. A única coisa possível foi arranjar um banco de plástico para sentar-se e esperar pelos seus familiares. Uma senhora jovem com um bebé recém-nascido de 20 dias ao colo perguntava-me, se era possível reaver os cartões de saúde que tinha deixado em casa.

A maioria dos evacuados protestavam a situação e não sabiam porque é que não obstante terem apresentado previamente várias queixas junto das entidades oficiais, sublinhando a questão da segurança do edifício, nada foi feito pelas referidas entidades oficiais para evitar a presente situação. Os meses foram passando e nenhuma entidade oficial se preocupou com o conteúdo das queixas. Com o tempo, a segurança do edifício foi-se deteriorando. Será que só com ocorrências mais graves, é que o Governo vai prestar mais atenção com a segurança e qualidade da vida dos cidadãos?

Ainda não estavam decorridos mais de vinte e quatro horas, quando somos solicitados pelos moradores do Edifício “Koi Fu” sita na Travessa da Corda de que o prédio estaria na iminência de ruir por terem recebido informações oficiais de que na próxima semana seria decretada a evacuação total dos moradores à semelhança do Edifício “Sin Fung”.

Os moradores, convidaram-me a visitar algumas das fracções mais afectadas que apresentavam múltiplas brechas, fendas de envergadura e sérias inclinações do pavimento. A “olho nu” conseguia-se ver a inclinação do prédio. Os moradores informaram-me que origem dos estragos estavam directamente relacionadas com as obras de demolição do prédio adjacente. A situação agravou-se ainda mais com as posteriores perfurações do subsolo.

Foram efectuadas várias queixas e todas elas caíram em “saco roto” sem quaisquer resultados para evitar a contínua degradação do edifício.

A curto e médio prazo, os evacuados e os moradores que ficaram prejudicados querem saber o seguinte:

1. Vai o Governo dialogar de imediato e directamente com os evacuados e os moradores que serão eventualmente evacuados com a finalidade de resolver os seus sofrimentos? Nem os subsídios que são neste momento concedidos e nem mesmo o futuro cheque pecuniário de dez mil patacas serão suficientes para minimizar a sua dor e tristeza.

2. Qual a seriedade duma entidade oficial que recebe uma queixa de um cidadão devidamente identificado? Porque é que as queixas não são levadas a sério? Será que não existe um prazo para resolução de queixas que podem demorar um mês, um ano e em muitas situações em mais de dez anos para contactar o queixoso e resolver o problema? Porque é que os procedimentos subsequentes à apresentação das queixas são quase sempre sigilosos e não se consegue obter qualquer informação quanto aos procedimentos ou diligências executadas, a executar ou prestes a serem executadas? Porque é que os queixosos não são devidamente informados dos procedimentos subsequentes das queixas e informados do prazo previsível para resolução do caso?

2. Porque é que os pedidos de demolição dos prédios não são devidamente analisados e implementadas medidas de segurança para evitar que estas demolições venham a afectar prédios vizinhos? Antes da demolição foram feitos estudos do subsolo para efeitos de segurança? Os equipamentos de demolição e perfuração cumprem regras de segurança e são adequados para efeitos de segurança dos prédios adjacentes? Porque não são exigidos às empresas de construção a adquisição de seguros para cobertura de acidentes desta natureza?

3. Porque é que as entidades responsáveis pela autorização das obras não fiscalizam devidamente as obras com objectivos preventivos evitando a degradação das situações e a ocorrência de danos quase irreparáveis?

 4. Vai o Governo assumir a sua dose de responsabilidade pelos danos causados nos Edifícios “Sin Fung” e “Koi Fu” face à grosseira irresponsabilidade, negligência no tratamento de queixas dos moradores e deficit de fiscalização por parte das entidades oficiais?

5. Vai o Governo contratar uma empresa internacional e independente para avaliar as origens dos danos causados aos dois edifícios aqui referidos e outros, e assacar as devidas responsabilidades?

6. Que medidas vão ser aplicadas a médio prazo para remediar e compensar os danos causados aos proprietários das moradias dos Edifícios “Sin Fung” e “Koi Fu”?

7. Que medidas preventivas vão ser de imediato implementadas para defesa e segurança do património privado e das vidas dos moradores de modo que situações idênticas não se repitam no futuro?

O Deputado da Assembleia Legislativa da Região Administrativa Especial de Macau aos 16 de Outubro de 2012.

 

José Pereira Coutinho

 

 

*
*
*
Conseguiu carregar os documentos
*
Conseguiu carregar os documentos