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INTERPELAÇÃO ESCRITA
 
 
 
O projecto do Metro ligeiro afectará para sempre o dia-a-dia de todos os cidadãos de Macau e mudará a face da RAEM. Sendo um concurso com enorme exposição internacional e depois do escândalo de corrupção com o ex-Secretário das Obras Públicas, não obstante o atraso na modernização legislativa no tocante à regulamentação dos concursos públicos, esperava-se mais que nunca que os concursos públicos relacionados com o Metro ligeiro fossem regidos pelos mais estritos princípios de legalidade, imparcialidade, transparência e rigor técnico. No entanto, desde o início, sempre pairaram juntos dos cidadãos suspeitas graves de que o presente concurso para o fornecimento dos veículos e sistema do Metro ligeiro estava a ser conduzido de forma cinzenta, injusta e ilegal, em claro favorecimento de um dos concorrentes. As razões que me levam a dizê-lo tão claramente são sustentadas por muitas informações, reclamações e relatos que têm chegado ao meu Gabinete de Atendimento ao Público sobre o que se tem passado, alguns dos quais, diversos deputados já fizeram eco dos mesmos. A situação caricata chegou a um ponto em que quase toda a administração, empresários, especialistas e alguns meios de comunicação social terem afirmado há meses de que um dos concorrentes já tinha ganho o concurso. Como isto será possível de acontecer ainda na RAEM? Como diz um ditado muito popular “Não há fumo sem fogo”
 
É absolutamente crucial, que o actual Governo que preza pela integridade e seja impoluto a todos os níveis da Administração, tome uma posição urgente sobre uma questão que poderá abalar novamente as fundações políticas e prestígio internacional da RAEM, em especial agora que o processo se encontra numa fase crucial, não podendo de maneira nenhuma arriscar a possibilidade de ser despoletado um segundo mega escândalo de corrupção do século.
 
Importa saber os factos e suspeições que chegaram ao nosso conhecimento e que rodeiam o problema do Metro.
 
Em primeiro lugar, a Comissão de Avaliação encarregue de preparar relatório de avaliação é composta por jovens técnicos sem experiência nesta área, apoiada por consultores que, repetidamente, foram ignorados nos seus pareceres ou solicitados para ignorar elementos negativos para uma determinada proposta. Aliás, só assim se compreende o facto inexplicável não ter existido um único pedido de clarificação técnica a qualquer dos concorrentes quando, segundo os concorrentes e especialistas em concursos internacionais, afirmaram no meu Gabinete que neste tipo de concursos há dezenas e por vezes centenas de pedidos de clarificações técnicas aos concorrentes! O próprio coordenador do GIT admitiu publicamente que o concurso era “muito complexo” aquando do anúncio público do adiamento da decisão para Outubro. Só há uma conclusão a retirar de uma Comissão de Avaliação inexperiente não solicitar clarificações: é que a proposta de um dos concorrentes já estaria predestinada para vencer o concurso!
Existe uma proposta para a opção da manutenção do metro ligeiro, que ninguém compreende porque razão deverá ser exercida, já que todos os especialistas indicam que é muito mais vantajoso que o futuro operador faça também a manutenção – aliás, como o próprio GIT parece admitir quando instruiu consultores para preparar o caderno de encargos para Operação e Manutenção! Por outro lado, uma das propostas, apresenta um valor que é sensivelmente metade das restantes e que é catalogada por todos os especialistas (por diversas vezes referidos na imprensa) como impossível, insuficiente ou subversiva, porque tem em vista encontrar formas de cobrar ao Governo trabalhos adicionais, como aconteceu no passado em situações mais ou menos idênticas. Aliás, essa mesma concorrente foi excluída de outros concursos internacionais por apresentar uma proposta para a manutenção demasiado baixa, que fez as autoridades desconfiar dessa proposta! Só há uma conclusão a retirar para a Comissão de Avaliação ter ignorado estes factos: é que uma das propostas já estaria predestinada para vencer o concurso!  
 
Por outro lado, uma questão de máxima importância e que muito me tem preocupado há muito tempo é naturalmente a segurança dos cidadãos. Os consultores internacionais do GIT afirmam que a ponte precisará de obras estruturais de melhoramento para garantir a segurança na circulação, independentemente do peso ou velocidade dos veículos. Há outros estudos, baseados nos critérios da China continental que mostram que todos os cabos de sustentação da ponte têm que ser mudados.
No entanto, sabe-se que um dos concorrentes não incluiu na sua proposta quaisquer obras estruturais, quando outro se propõe mudar todos os cabos, algo que foi ignorado pela Comissão de Avaliação! Nem o GIT, nem os seus consultores, nem a Comissão de Avaliação têm especialistas em questões relacionadas com a segurança nas estruturas de pontes, apesar de nenhuma clarificação ter sido solicitada aos concorrentes, o que para mim é muito estranho.
 
O Governo, na minha última intervenção no hemiciclo, insinuou que este facto não era relevante porque tinha sido levantado por outro concorrente, mas o relatório dos consultores e os critérios da empresa do interior do continente são factos e não opiniões. Como pode o Governo tratar da protecção das vidas dos cidadãos de Macau com esta veleidade? Entenderá o Governo que basta pedir a um concorrente que emita uma declaração de responsabilidade para proteger a vida dos cidadãos de Macau? Para que servirá essa declaração se a ponte cair e por infelicidade vierem a perecer cidadãos de Macau? Quem naquela altura vai assumir esta grande responsabilidade?
 
Por fim, consta que a minuta do contrato a ser celebrado entre a RAEM e o adjudicatário está já desenhado para o concorrente predestinado, e/ou encobrindo e mascarando as falhas e omissões na proposta, algo que é claramente violador:
·        Da legalidade, por frontalmente contrariar normas legais aplicáveis ao concurso;
·        Da igualdade, por tratar um concorrente de forma claramente mais favorável em relação às dos demais concorrentes; e
·        Da prossecução do interesse da Administração, por preferir proposta técnica e legalmente deficiente, com os riscos e custos acrescidos que tal escolha indubitavelmente representará para a RAEM.
 
 
A situação chegou a um ponto tal que a concorrente preferida já reviu a minuta do contrato antes ainda do parecer do departamento jurídico do respectivo Secretário e do despacho do Chefe do Executivo.
 
 
Assim sendo, interpelo o Governo, sobre o seguinte:
 
 
1. Vai o Governo investigar todas as suspeições que acima referidas e as razões porque não foram solicitadas quaisquer clarificações aos concorrentes? Porque o GIT apenas solicitou aos consultores pareceres específicos sobre um dos concorrentes e não de todos os concorrentes? Porque foram ignoradas as questões da baixa proposta de manutenção de um dos concorrentes e da ausência de quaisquer obras na ponte Sai Van? Será que segurança da ponte e a vida dos cidadãos não são valores fundamentais que deviam ser levados primordialmente na presente adjudicação?
 
2. Quais foram as razões que levaram a que a Comissão de Avaliação não efectuasse uma análise imparcial e objectiva não indagando junto das autoridades governamentais dos países em causa, para saber das razões da exclusão de um concorrente por ter apresentado valores estranhamente baixos e impraticáveis?
Como vai o Governo garantir no momento que o concorrente preferido incluiu na proposta todos os requisitos do concurso relativo às obras e melhoramentos da ponte Sai Van para segurança dos cidadãos que utilizem a referida ponte? Como vai o Governo garantir que não tenhamos de pagar mais no futuro por trabalhos e equipamentos que foram neste momento omitidas pela concorrente preferida?
Pode o Governo garantir que a minuta do contrato não contém cláusulas inválidas por violação da lei fundamental de Macau, nomeadamente dos princípios referidos acima, tais como contendo cláusulas que representam modificações ou correcções da proposta do concorrente preferido?
 
 
 
3. Vai o Governo ponderar sobre a possibilidade de nomear uma comissão ou designar uma empresa de renome mundial, absolutamente independente, para fazer uma avaliação imparcial e especializada sobre as três propostas, a bem do erário público e segurança dos cidadãos?
 
 
 
O Deputado à Assembleia Legislativa da Região Administrativa Especial de Macau aos 23 de Agosto de 2010.
 
 
José Pereira Coutinho
 
 
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