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INTERPELAÇÃO ESCRITA

 

O actual sistema fiscal de Macau é composto por diversos impostos, que tiveram origem em diferentes épocas e se foram alterando ao longo do tempo. As alterações mais relevantes, dado que as restantes foram de pequena dimensão efectuaram-se em 1964 e 1978, mediante a publicação de novos regulamentos fiscais que visaram a tributação directa.

A Reforma fiscal de 1964 teve por referência idênticas reformas ocorridas na altura em Portugal e nas outras províncias ultramarinas portuguesas, reformulando-se diversos impostos e foram na altura publicados os Regulamentos da Contribuição Predial Urbana, do Imposto Profissional, da Contribuição Industrial e do Imposto Complementar de Rendimentos. 

À Reforma fiscal de 1978 relativamente aos impostos sobre o rendimento foram aprovados os Regulamentos do Imposto Profissional, da Contribuição Predial Urbana e do Imposto Complementar de Rendimentos, realizando-se a designada revisão global do regime da tributação directa sobre o rendimento ou reforma tributária de 1978. Com esta revisão procurou-se, não só, introduzir alguns aperfeiçoamentos de política e técnica tributária aos impostos então vigentes, como reformular toda a anterior legislação fiscal.

 

As reformas fiscais atrás indicadas, cujas linhas gerais foram mantidas até ao presente, não alteraram, contudo, a estrutura do sistema cedular.

A RAEM, após alguns anos de recessão económica, o melhoramento do ambiente de investimento, o forte crescimento económico e as perspectivas optimistas quanto ao futuro de Macau suscitaram a atenção de investidores estrangeiros, especialmente, nas indústrias do Jogo e Turismo, com a injecção de capital de elevado montante em muitos projectos, públicos e privados, não só para os novos casinos como também para actividades conexas aos mesmos (por exemplo, a actividade hoteleira e de restauração), com o consequente acréscimo de trabalhadores emigrantes (em princípio, não apenas potenciais mas reais contribuintes), de modo a suprir a falta de recursos humanos locais qualificados.

      

Por outro lado, a fim de aumentar a competitividade internacional, o Governo da RAEM, aproveitando as vantagens da sua posição geográfica e visando o seu desenvolvimento económico, tem-se esforçado por melhorar o ambiente comercial de investimento e por reforçar a cooperação comercial com o exterior, através de plataformas de serviços económicos e comerciais de excelência.

 

Em resumo, a realidade económica e social de Macau é completamente diferente da que existia nos finais da década de 70, quando se procedeu à reforma tributária de 1978.

      

Como vimos, Macau está a modernizar-se economicamente. E, no âmbito fiscal, cabe questionar o seguinte: As alterações legislativas entretanto efectuadas são suficientes para acompanhar tal modernização? A resposta parece-nos negativa, com maior relevância para o Imposto sobre o Rendimento.

 

Com efeito, vigora em Macau, um sistema com preponderância dos elementos cedulares (cfr. imposto profissional, contribuição predial e imposto complementar), quando, face às modernas exigências de equidade, a substituição desse sistema por uma solução unitária atingindo globalmente os rendimentos individuais ou seja, o imposto sobre o rendimento de pessoas singulares (IRS), é inequivocamente superior ao puro sistema cedular, pois, a solução unitária: (a) permite a distribuição da carga fiscal segundo um esquema racional de progressividade, em consonância com a capacidade contributiva; (b) embora comportando várias categorias de rendimentos, devido à diversidade dos regimes de tributação, especialmente no campo da determinação do rendimento e dos métodos de percepção do imposto, não prejudica o tratamento unitário da matéria colectável, reflectido basicamente na aplicação de uma única tabela de taxas progressivas (5); (c) e procura harmonizar a concepção da tributação pessoal, própria do sistema unitário, com atenção imprescindível às particularidades relevantes das diferentes categorias de rendimento. Exemplificando: os rendimentos da actividade comercial e industrial não estão sujeitos a regras idênticas às aplicáveis aos rendimentos prediais, mantendo-se, independentemente da unicidade tributária que se pretenda visar, várias categorias de rendimentos.

 

No momento actual em que se pretende implementar, em pleno, os princípios da eficiência e da desburocratização da Administração Pública, sendo, exemplo disso, o regime de “One Stop Service” - e assegurar maior comodidade aos administrados no cumprimento das suas obrigações, não restam dúvidas que a simplificação da tributação do rendimento é da maior importância, de modo a eliminar normas, procedimentos burocráticos e despesas desajustadas à realidade actual - nomeadamente, a fixação da matéria colectável por Comissão de Fixação a que se refere a alínea c) do nº 1 do artigo 18°  do Regulamento do Imposto Profissional.

 

A unicidade do imposto, por si só, torna desde logo possível o englobamento, numa única declaração anual, dos rendimentos de todas as categorias, não só de cada contribuinte, como ainda de mais do que um contribuinte, o que se verifica, em princípio, no caso de contribuintes casados, quanto aos rendimentos de ambos os cônjuges. Exemplificando, com o IRS, 1 casal em que um dos cônjuges seja trabalhador por conta de outrem e exerça também uma profissão liberal e outro dos cônjuges exerça uma actividade comercial, passará a apresentar uma única declaração de rendimentos anuais (acompanhada dos anexos correspondentes às respectivas categorias de rendimentos), em substituição das actuais declarações de imposto profissional e de imposto complementar.

 

Deste modo e numa época em que as modernas tecnologias - de que Macau dispõe em absoluto - proporcionam um tratamento informático das operações e de administração, a reforma da tributação do rendimento, além de ser de extrema importância, é indispensável para responder aos desafios que se deparam e à renovação das mentalidades relativas ao cumprimento dos deveres tributários, constitui uma das traves mestras da indispensável modernização da melhoria do relacionamento entre a RAEM e os seus administrados / contribuintes, visando objectivos de eficiência económica e de realização de justiça social, eliminando formalidades burocráticas excessivas e inúteis, simplificando o cumprimento dos deveres tributários, e proporcionando ainda outras vantagens que, por razões de economia de tempo, aqui não trago à colação.

             

(1) A classificação de impostos directos e impostos indirectos não assenta, dada a sua complexidade, num critério uniforme aceite pela doutrina, que propõe os mais variados critérios para os distinguir, sendo critérios económicos os baseados na manifestação da capacidade contributiva, na repercussão e na natureza do facto gerador da obrigação de imposto. Por exemplo, determinada corrente doutrinal faz a distinção baseada no modo de determinação do contribuinte, pertencento os impostos a um ou outro grupo consoante a sua cobrança pressuponha ou não a existência de uma lista nominativa de contribuintes, sendo impostos directos aqueles cujo lançamento se baseia na elaboração prévia dessa lista e impostos indirectos, no caso contrário. Este critério baseia-se na natureza do facto gerador da obrigação de imposto, dado que a elaboração da citada lista é possível pela permanência ou estabilidade da faculdade contributiva.

 

(2)     No sistema fiscal de Macau, quanto ao objecto de incidência, temos como impostos sobre o rendimento: imposto profissional, contribuição predial urbana e imposto complementar de rendimentos.

 

(3)     O «sistema cedular» consiste em impostos separados e entre si não articulados, incidentes sobre as diferentes fontes de rendimento.

 

(4)     A taxa é progressiva, quando se eleva à medida que aumenta a matéria tributável, como acontece, por exemplo, no imposto profissional.

 

 

Assim sendo, interpelo o Governo sobre o seguinte:

 

1. Passados mais de vinte e um anos (21) anos desde a última reforma fiscal em Macau e dadas as alterações fiscais, que entretanto foram feitas, não acompanharam suficientemente a realidade económica, empresarial e social da RAEM, a qual é totalmente diferente da que existia em 1978, não é de interesse público proceder-se à modernização e reforma do sistema fiscal?

 

2. Tendo em conta os princípios da prossecução do interesse público, da eficiência e da desburocratização da Administração Pública, e de modo a simplificar a tributação do rendimento, eliminar procedimentos burocráticos inúteis e dispendiosos para o erário público e garantir maior comodidade aos contribuintes que tratando-se de trabalhadores dependentes atingem um elevado numero no sector dos casinos e actividades conexas porque não adoptar, em substituição do actual sistema com preponderância dos elementos cedulares (imposto profissional, complementar, etc.) um imposto sobre o rendimento de pessoas singulares (IRS) já introduzido com muito sucesso em muitos países avançados?

 

3. A entrada em vigor dum Código de Processo Tributário não constitui um instrumento indispensável, inadiável e urgente da justiça fiscal, destinado a preencher, nomeadamente o vazio legislativo resultante da cessação da vigência das normas relativas às execuções fiscais, por força do disposto do nº. 4 do artigo 4º da Lei da Reunificação (Lei n.º 1/1999)?

 

 

 

 

O Deputado à Assembleia Legislativa da Região Administrativa Especial de Macau aos 18 de Maio de 2010.

 

 

José Pereira Coutinho

 

 

 

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