Interpelação Pag. Principal >> Interpelação

INTERPELAÇÃO ESCRITA

 

 

O Tribunal de Última Instância (TUI) no Acórdão, n.º 16/2010, de 29 de Abril de 2010, decidiu anular o acto praticado pelo Presidente do Conselho de Administração do Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais (IACM) que proibiu a utilização do Jardim Triangular da Areia Preta que os manifestantes tinham escolhido como lugar de reunião e de partida de manifestação no dia 1 de Maio, Dia Mundial dos Trabalhadores.

 

O IACM desculpou-se para impor a proibição dizendo que o local já tinha sido atribuído a outros residentes para realizar actividades de reuniões e manifestações. Por isso, atribuiu outro local, a porta principal do Parque Municipal Dr. Sun Iat Sen a uma das associações de trabalhadores locais, para servir de lugar de partida da manifestação, um local situado numa zona periférica da cidade.

 

O TUI recorda, que o direito de reunião, de desfile e de manifestação são direitos fundamentais dos residentes da Região Administrativa Especial de Macau e, no que respeita à proibição, considera que «na realidade, é princípio geral do Direito Administrativo que os órgãos administrativos só dispõem dos poderes previstos na lei (art.º 31.º do Código de Procedimento Administrativo). A lei não confere competências aos órgãos do IACM no sentido de não permitir manifestações ou impor restrições a manifestações com fundamento na existência de outras manifestações ou outras actividades para o local pretendido. Por isso, a entidade recorrida, não pode decidir com o poder não consagrado na lei».

 

No que toca à escolha do lugar para reunião e manifestação o TUI considera que «deve caber ao promotor da actividade, sem prejuízo de cumprir as formalidades de aviso prévio e dos poderes do Presidente do Conselho de Administração do IACM e do Comandante da PSP previstos na Lei n.° 2/93/M».

 

O TUI recorda a “ratio” legislativa do n.º 2 do artigo 4.º da Lei n.º 2/93/M, prestada na Assembleia Legislativa aquando da discussão da referida lei.

 

Ou seja, o Presidente do Conselho de Administração do IACM, de forma ilegal, decidiu restringir o legítimo direito de manifestação dos trabalhadores no dia 1 de Maio de 2010, Dia Mundial dos Trabalhadores.

 

E estas ilegalidades do IACM, consideramos que já são praticadas há muitos anos. Entendemos que os argumentos do Acórdão do TUI se poderiam aplicar, com as devidas adaptações, à proibição imposta pelo IACM, em 1 de Maio 2007, que os manifestantes desfilassem pela Avenida Almeida Ribeiro. Proibição que resultou em desacatos contra os manifestantes e num transeunte ferido pelo ricochete de uma das cinco balas disparada pelas autoridades policiais.

 

É necessário, portanto, apurar as devidas responsabilidades por todas estas ilegalidades e pela violação do direito de reunião, de desfile e de manifestação que é um direito fundamental dos residentes da Região Administrativa Especial de Macau. É necessário apurar a responsabilidade, pela violação da lei.

 

Mas as manifestações deste ano, do Dia Mundial dos Trabalhadores voltaram a ser manchadas quando as autoridades policiais bloquearam alguns manifestantes na Avenida Ribeira do Patane, quando estes pretendiam dirigir-se à Avenida Almeida Ribeiro. Um cordão policial com um número desproporcionado de polícias armados com bastões, aerossol de pimenta e atrás havia um veículo com canhões de água.

Várias ruelas laterais foram bloqueadas para impedir o afluxo de outras pessoas que pretendiam juntar-se aos manifestantes. Exactamente tal como aconteceu no dia 1 de Maio de 2007.

 

Para justificar a actuação policial o Secretário para a Segurança (SS) considerou a manifestação ilegal e argumentou «Macau é um território pequeno e a Avenida Almeida Ribeiro é uma zona comercial importante. Tem bancos e ourivesarias e seria conveniente não passar por ali». Também referiu que a manifestação podia ferir a imagem de Macau.

 

Ora estas justificações e a actuação das autoridades para restringir a manifestação não estão de acordo com a lei. Desde 2007 que isso ficou demonstrado e o Acórdão do TUI, que referimos anteriormente, assim evidencia.

 

Aliás, já na sequência dos incidentes verificados na manifestação do dia 1 de Maio de 2007 apresentei, dia 25 de Maio de 2007, uma interpelação oral, neste hemiciclo, em que questionava quem no Governo e ao mais alto nível, ia assumir as responsabilidades por ter proibido o acesso a muitos cidadãos que pretendiam participar na manifestação, violando os direitos humanos básicos de livre participação na manifestação consagrados na Lei Básica.

 

Por outro lado, se os jovens, no dia 1 de Maio de 2010, se manifestaram, frente às instalações da TDM, contra a censura, já no dia 21 de Maio de 2007, e a propósito de factos relacionados com a cobertura noticiosa da manifestação do dia 1 de Maio de 2007, apresentei, neste hemiciclo, uma interpelação escrita em que defendia a liberdade e a independência da imprensa e questionava a interferência ou participação de funcionários ou de membros do Governo na produção noticiosa da TDM.

 

Assim sendo, interpelo o Governo sobre o seguinte:

 

1. Vai o Governo apurar responsabilidades pelas ilegalidades praticadas e pela violação do direito de reunião, de desfile e de manifestação, que são direitos fundamentais dos residentes da Região Administrativa Especial de Macau, pelo facto do IACM ter proibido a utilização do Jardim Triangular da Areia Preta como lugar de reunião e de partida de manifestantes no dia 1 de Maio de 2010?

Vai o Governo apurar responsabilidades pelas ilegalidades praticadas e pela violação do direito de reunião, de desfile e de manifestação por ter atribuído outro local, a porta principal do Parque Municipal Dr. Sun Iat Sen, para servir de lugar de partida da manifestação, situado numa zona periférica da cidade, quando a escolha do lugar para reunião e manifestação, deve caber ao promotor da actividade?

 

2. Vai o Governo apurar responsabilidades pelas ilegalidades praticadas e pela violação do direito de reunião, de desfile e de manifestação, que são direitos fundamentais dos residentes da RAEM, pelo facto das autoridades terem bloqueado os manifestantes na Avenida Ribeira do Patane, quando estes pretendiam dirigir-se à Avenida Almeida Ribeiro?

No tocante ao fundamento de direito, quais as disposições que, no entender do Governo, serviram de base normativa para as autoridades terem proibido, desde 2007, a passagem dos manifestantes, pela Avenida Almeida Ribeiro, quando os promotores da manifestação tinham comunicado ao IACM essa sua intenção?

Sendo certo e sabido que os bancos estariam encerrados no dia 1 de Maio, quer por se tratar de dia feriado, quer por ser Sábado, por que motivo considerou o Secretário para a Segurança que a passagem do desfile pela Avenida Almeida Ribeiro colocaria em perigo a segurança dos estabelecimentos bancários aí situados? Que factos temia o Secretário para a Segurança que, em tal circunstância, pudessem vir a ser praticados contra os ditos estabelecimentos? Com base em que informações ou indícios?

Dado que o Secretário para a Segurança, segundo as suas próprias palavras, temia igualmente pela segurança das ourivesarias sitas na Avenida Almeida Ribeira, por que razão não optou antes por destacar agentes policiais para se irem posicionando junto das ourivesarias e outros estabelecimentos comerciais à medida que o desfile fosse avançando pela referida avenida, em vez de utilizar esses mesmos recursos humanos para bloquear o desfile na Rua Ribeira do Patane e impedir a sua passagem pela Avenida Almeida Ribeiro? Não seriam esses agentes policiais - concentrados em tão grande número para imporem o mencionado bloqueio - suficientes para defenderem os estabelecimentos comerciais localizados na Avenida Almeida Ribeiro? Não teriam eles meios para assegurarem tal protecção? Não terá precisamente a enorme concentração de agentes policiais na Rua da Ribeira do Patane aumentado o risco de insegurança noutras partes da cidade, incluindo a Avenida Almeida Ribeiro?

 

3. Vai o Governo agir em conformidade com o Acórdão, n.º 16/2010, de 29 de Abril de 2010, e deixar de restringir, ilegalmente, o direito de reunião, de desfile e de manifestação, que é um direito fundamental dos residentes da Região Administrativa Especial de Macau, e, por exemplo, permitir, no dia 1 de Maio de 2011, que os manifestantes possam escolher, livremente, os lugares para reunião e manifestação e, designadamente, possam desfilar pela Avenida Almeida Ribeiro?

 

 

  

O Deputado à Assembleia Legislativa da Região Administrativa Especial de Macau aos 03 de Maio de 2010.

 

 

José Pereira Coutinho

 

 

 

 

 

 

*
*
*
Conseguiu carregar os documentos
*
Conseguiu carregar os documentos