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INTERVENÇÃO ANTES DA ORDEM DO DIA

 

 

Dia 12 de Novembro de 2009, a maioria dos deputados, votou contra uma proposta de audição destinada a analisar, nesta Assembleia, a concessão, pelo governo, de terrenos a uma empresa não titular de uma licença de jogo, mas ligada a uma concessionária.

 

Entre os argumentos para chumbar a audição foi invocada a legalidade dos procedimentos do governo, que teria agido de acordo com a lei.

É uma opinião que podia ser analisada até porque uma das leis citadas, a Lei n.º 16/2001, que define o regime jurídico da exploração de jogos de fortuna ou azar em casino e regulamenta o regime das concessões, foi aprovada por esta Assembleia Legislativa e é, portanto, a esta Assembleia que cabe interpretá-la, o que poderia ser feito em sede de audição. 

 

Mas mesmo que se admita que os procedimentos do governo estão de acordo com a lei é óbvio que, independentemente da questão da legalidade, os deputados à Assembleia Legislativa têm o direito de obter esclarecimentos da parte do Governo, dar a sua opinião, sugerir e propor as devidas alterações. A Assembleia Legislativa (AL) como qualquer outro parlamento intervêm principalmente no âmbito da função política, e não da função judicial.

 

O que a maioria da população pretende, é que, esta Assembleia Legislativa desempenhe de uma forma cabal o seu papel fiscalizador da acção do governo, nos moldes próprios dos Estados de direito democráticos e não que ela actue e seja como uma assembleia "carimbadora".

 

No quadro de um processo de audição, todos os deputados poderiam, não só obter informações objectivas sobre determinados factos e justificações sobre os mesmos, mas também ouvir opiniões jurídicas diversas, nomeadamente dos seus próprios assessores e dos assessores do Governo. No decorrer da discussão poder-se-ia chegar à conclusão de que os actos do Governo foram, afinal, ilegais, ou então poder-se-ia chegar à conclusão de que foram legais, mas que a lei é má e precisa de ser mudada, actualizada ou preenchida as suas lacunas para não mais permitir mais actos que venham a prejudicar os interesses fundamentais dos cidadãos de Macau.

 

O que a maioria dos deputados da Assembleia Legislativa fez, foi bloquear a acção da Assembleia Legislativa nesse sentido, de modo a dar cobertura à acção do governo neste caso relacionado com uma grande empresa.

 

Neste caso de concessão de terrenos, não podemos esquecer mas pelo contrário ter sempre em consideração, que no processo de escolha das empresas ligadas ao jogo, a capacidade económica destas e a sua boa situação financeira, foram alguns dos principais factores que foi tido em conta para lhe serem atribuídas as concessões para explorarem o jogo em casinos. É por isso de interesse público saber qual a razão de lhe serem atribuídos depois mais terrenos, sem recurso, por exemplo, a hasta pública, e que depois se destinam a fins imobiliários, de especulação imobiliária podemos dizer face aos altos valores que depois são vendidos.

 

Deve ter-se em conta e a audição ajudaria a clarificar se a concessão dos terrenos em causa se verificou ou não após a empresa concessionária ter concluído o aproveitamento dos terrenos anteriormente concedido.

 

Foi, também, apresentado o argumento para votar contra a proposta de audição, segundo o qual não seria justo convocar o Governo só por causa desta concessão sem o fazer também para as outras já efectuadas.

 

Mas então em vez de se votar contra a proposta de audição melhor seria apresentar uma contraproposta, pedindo a audição do Governo sobre todas as concessões, e não só sobre aquela. Ou então poder-se-ia ter proposto aos proponentes um compromisso político no sentido de que, depois da audição do Governo relativamente a esta concessão, eles proporiam ou votariam a favor de uma proposta de audição do Governo relativamente às outras. Creio que os proponentes teriam aceite isso. Se os proponentes recusassem isso tudo e ficasse claro que, afinal, eles estavam a adoptar uma postura discriminatória em relação a determinada empresa - e que, portanto, a proposta deles consubstanciava discriminação -, só então, dizia, se justificaria logicamente que se votasse contra a proposta de audição.

 

Aliás, já depois da proposta de audição sobre a concessão de terrenos ter sido chumbada na Assembleia, o Chefe do Executivo numa conferência de imprensa no dia 18 abordou a questão tecendo considerações sobre o caso e sobre a reacção de uma operadora de jogo que criticou a concessão e o facto de não lhe terem sido atribuídos terrenos no COTAI.

O Chefe do Executivo terá dito que em 2002 “a concessionária em regime de monopólio disse que não ia investir no COTAI porque só malucos o fariam”. “No processo de atribuição de licenças pedimos às outras concessionárias que investissem em grande escala no Cotai”, tendo essa solicitação sido bem acolhida pelas novas operadoras do mercado. Referiu ainda que “neste momento não podemos conceder mais terrenos à sua empresa”.

 

O Chefe do Executivo é livre de fazer as declarações à imprensa que quiser e ainda bem que as faz, agora não se compreende a razão dos esclarecimentos sobre casos tão relevantes não poderem ser analisados e verificados através de uma audição. Nos termos da alínea 8) do artigo 71.º da Lei Básica, a AL pode ouvir pessoas e por via do processo de audição podem ser esclarecidas questões de interesse público.

 

O processo de audição é um mecanismo derivado do normal exercício das competências próprias da AL, previsto nos artigos 142.º e 143.º do Regimento da AL, aprovado pela Resolução n.º 1/1999 e alterado pelas Resoluções n.ºs 1/2004 e 2/2009 e foi regulamentado pela Resolução n. º 4/2000.

 

Por todas as razões expostas, considero que a Assembleia Legislativa (AL) devia ter aprovado a proposta de audição sobre a concessão de terreno no COTAI a uma empresa ligada ao jogo não só para esclarecimento de uma questão considerada relevante interesse público como também o direito que assistem a todos os cidadãos de Macau de serem devidamente informados quanto ao destino dos nossos principais recursos naturais.  

 

 

O Deputado da Assembleia Legislativa da Região Administrativa Especial de Macau aos 24 de Novembro de 2009.

 

José Pereira Coutinho

 

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