ATFPM DIRECÇÃO

JOSÉ PEREIRA COUTINHO

Deputado à Assembleia Legislativa e Presidente da Direcção da ATFPM

ATFPM Traimestral

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INTERVENÇÃO ANTES DA ORDEM DO DIA

 

 

A moral da maioria dos trabalhadores da Administração Pública de Macau é a mais baixa de sempre. Quer pessoal activo, quer pessoal aposentado ou que recebem pensões de sobrevivência, estão quase todos tristes com a quase caótica e desastrada forma como tem sido gerida a Administração Pública de Macau, nos últimos quase dez anos. Disse-o aqui tantas vezes, que já não lembro do número de vezes que tenho vindo a repetir neste hemiciclo.

Da parte do Governo, quase que ninguém quer saber. Pensam que ignorando o assunto, os problemas se resolvem por si mesmo. Enganam-se, porque se assim pensam, estão simplesmente a transferir estes mesmos problemas e respectivas responsabilidades para o próximo Governo da RAEM.

E mais, se pensam que “branqueando” ou utilizando produtos “cosméticos” nos problemas, conseguem deste modo iludir ou enganar a população e os trabalhadores da Administração Pública, então, ainda mais estão enganados, porque a população e os trabalhadores da APM estão mais conscientes, e têm melhor compreensão da gravidade das situações e da irresponsabilidade governativa. Mas somente não reclama de uma forma mais aberta, porque preferem esperar pelo próximo Governo, porque acham que este Governo já está a dar sinais de desnorteamento no final da governação e já “deu” o que tinha para “dar”.

 

Mas ainda mais espantoso, é que nos últimos tempos, até parece que desapareceu a responsável pela pasta da área de Administração e Justiça, após aprovação da Lei de Segurança Interna. Para a maioria dos trabalhadores da Administração Pública de Macau (APM) até parece que a responsável desta pasta governativa entrou no período de hibernação pré-aposentação, onde salvo raras excepções, aparece na capa dos jornais locais, ora demonstrando “artes de jardinagem” ora cortando fitas, ora em deslocações ao cabeleireiro.

 

A moral dos trabalhadores é baixa, porque este Governo cometeu o primeiro pecado mortal, ao eliminar o sistema de pagamento de pensões de aposentação e sobrevivência à maioria do pessoal do quadro, especialmente aos agentes das Forças de Segurança de Macau (FSM) passando-os para um estado de precariedade laboral, transformando-os num conjunto de trabalhadores “mercenários”, ou de meninos de “salti-bancos”, ora pulando dum serviço público para outro, ora do sector público para a privada, quase sempre consoante as regalias, condições de trabalho e salários.

 

Muitas outras razões têm contribuído, para o grande mal-estar no seio da maioria da função pública, como por exemplo, a falta de legislação específica para responsabilização dos cargos de Chefe de Executivo e principais cargos políticos, tais como a responsabilização dos secretários. Isto porque, na maior parte das vezes, a responsabilidade quase sempre, somente é assacada ao pessoal das categorias inferiores e pessoal da linha de frente.

Os sucessivos atrasos na reforma da máquina administrativa (carreiras) que já tem barbas brancas e as demoras na reformulação dos vários projectos-lei da responsabilidade do Governo, tais as carreiras médicas, enfermagem, técnicos diagnóstico, auxiliares, têm manifestamente contribuído muito para degradar ainda mais, a baixa moral da maioria dos trabalhadores.

 

Outra nota importante a realçar para a queda brutal da moral dos trabalhadores da função pública desde o estabelecimento da RAEM, tem a ver com o exemplo dado pela tutela da área da Administração Pública e Justiça (AJ) em que, quem tem poder nas mãos “pode” e “manda” e não precisa de justificar nem assumir responsabilidades pelos seus actos, ou seja vão-se praticando actos de “instrumentalização dos serviços públicos”, uma autêntica implementação de “gestão de mercearia”.

 

A seu “belo prazer”, e com “contratos individuais de trabalho” lá vão “enfiando” os seus “amigos” e “afilhados” na função pública, aumentando os seus salários de ano a ano. Porém, o pessoal do quadro para além de “levar nos ombros” o ”calvário” do trabalho e a responsabilidade da formação contínua dos novos colegas, continuam a “marcar passo”, ou a “ver os navios a passar” em matéria salarial, muitos marcando passo no mesmo índice, há mais de 17 anos. Que raio de governação e de justiça é essa, que se encontra instalada no seio da função pública? 

 

Os contratos individuais de trabalho, (CIT) são neste momento instrumentos importantes no mecanismo contratual de manter muitos trabalhadores cegamente obedientes, porque os que não obedecem vêem os seus contratos renovados somente durante um período de 6 (seis) meses, cuja forma de renovação dos contratos pode durar mais de 3 (três) anos. Assim são geridos muitos dos nossos preciosos recursos humanos do sector público. E o mais grave é que mesmo após a tutela ter conhecimento desses abusos, a situação continua mesma, sem que ninguém do Governo tenha a coragem de acabar com estas prepotências e abusos de poder.

 

Esta tutela da AJ promove de uma forma aberta a cultura dos “amigos e afilhados”, traficando influências, implementado a cultura da graxa e adulação. Para poder sobreviver neste podre sistema de governação da Administração Pública misturado com incompetência e abuso do poder que desemboca na má governação, à custa de “branqueamento” de factos, escondem-se os problemas e os escândalos, e distribuem-se de uma forma generosa “subsídios” para instituições universitárias locais e do interior do continente para dar vida a cursos de formação que no final das contas, para além de não ter quaisquer efeitos práticos nos formandos em termos de aplicação diária, serve contudo, no essencial para manter elevados os números de pessoas formadas, para justificar trabalho feito, mas descurando a qualidade, mas principalmente para manter incólume a “cadeira do poder” da Secretaria AJ de uma forma estável e saudável.

 

Para a tutela da AJ, os valores profissionais, tais como a competência, o mérito e o espírito de sacrifício não têm valor, não significam nada num mundo de incompetência, ou dito doutra forma, talvez nem sequer sabem qual o significado destas qualidades profissionais. Resta a satisfação de saber, que a grande maioria dos trabalhadores principalmente da linha de frente têm a nova esperança que melhores dias virão para melhorar a sua vida profissional, sob a égide de um Governo que se espera que seja mais transparente, mais responsável, mais sério, mais dialogante, mais democrático e mais competente e menos corrupto.

 

Todos os dias, sou abordado, por um enorme número de trabalhadores da linha de frente que perguntam, o que aconteceu ou seja “quo vadis” dos subsídios?

Será que adiando o problema, também será, mais uma “batata quente “ ou presente envenenado” para o próximo Governo? Os trabalhadores têm memória fresca, porque foi com pompa e circunstância que o Governo divulgou que brevemente seriam revistos os subsídios dos trabalhadores da APM, incluindo o pessoal das FSM.

Afinal o que se passa? Cada dia que passa é mais um dia de sacrifício para os trabalhadores das classes mais humildes. Por outro lado, os trabalhadores das FSM perguntam a mim, se a Secretaria da AJ está a sabotar o projecto de actualização dos subsídios do pessoal das FSM que também ficou em “banho de Maria” ou esquecido numa das muitas gavetas da tutela da AJ também a aguardar a vinda do próximo Governo?

Alguém do Governo poderá dar alguma resposta do que passa sobre esta matéria? Da mesma forma, muitos trabalhadores da APM questionam o que a Secretária está a fazer o problema das carreiras, e o aumento salarial de 15% e 20% para todos os trabalhadores. Gostaria de saber se alguém do Governo quer dar uma resposta a estas importantes questões, que todos estão a espera a muito tempo e que no fundo constituem aspirações legítimas dos trabalhadores, face à forma como são explorados quase todos os dias, onde têm de assumir funções de outras categorias mais elevadas, incluindo muitas vezes a execução do triplo do seu trabalho.

Ou seja, nem num mundo de exploração selvática dos recursos humanos do sector público, se tem a consciência de compensar o mínimo de acordo com a consciência e dignidade humana. E este é um muito mau exemplo para o sector privado de como são geridos os nossos recursos humanos no sector público.

 

A terminar, só espero que a Secretária para AJ não venha ao hemiciclo desta vez pedir-me provas de tudo aquilo que foi aqui dito. Porque a “maldição” poderá repetir-se, como aconteceu nos finais do ano de 2006, onde me foi exigido a apresentação de provas quanto ao abuso de poder e corrupção praticados por altos quadros da APM. Na altura, não foi preciso apresentar provas, porque se lembram, uma semana depois de me terem exigido a apresentação de provas neste hemiciclo a fim de não denegrir a imagem deste Governo, conforme me era exigido pela ilustre Secretária da AJ, eis que era detido o ex-Secretário Ao Man Long por suspeita de prática de crimes de corrupção e abuso de poder.

 

A história universal e a experiência humana ensinam-nos, de que, de nada vale “branquear”, porque, mais cedo ou mais tarde, as verdades aparecem por cima, ou seja, são como o azeite num copo de água, sempre vem à tona da água.

Também às vezes as “maldições” não andam “solteiras”, podem estar unidas pelo “casamento” ou “união de facto”, porque primeiro vem a “mulher”e ninguém garante que depois não venha o “marido” ou “parceiro”.

 

O Deputado à Assembleia Legislativa da Região Administrativa Especial de Macau aos 26 de Março de 2009.

 

José Pereira Coutinho

 

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